Encontro em Santiago: a reação de Lula e de líderes progressistas à ofensiva de Trump
Nesta segunda-feira (21 de julho de 2025), ocorreu em Santiago, no Palácio de La Moneda, a cúpula “Democracia Sempre”, reunindo cinco chefes de Estado — Lula (Brasil), Gabriel Boric (Chile), Pedro Sánchez (Espanha), Gustavo Petro (Colômbia) e Yamandú Orsi (Uruguai). O objetivo principal foi consolidar uma frente comum em defesa da democracia, do multilateralismo e contra o avanço de discursos autoritários e a desinformação nas redes.
Contexto político e tensão diplomática
A convocação desta cúpula ganha peso no cenário político internacional, especialmente diante de pressões recentes dos Estados Unidos. O ex-presidente Donald Trump chegou a ameaçar impor tarifas de 50% às exportações brasileiras, condição atrelada ao arquivamento dos processos contra Jair Bolsonaro no Brasil. Lula classificou esse gesto de chantagem política inaceitável, afirmando que se trata de tentativa de interferência na soberania nacional e sinalizou que o Brasil poderá adotar medidas retaliatórias.
Na avaliação de Lula, essas ações revelam a utilização de “tarifas como arma política-eleitoral” por governos conservadores, que violam o princípio do comércio internacional justo.
A carta conjunta e os temas centrais
No fim de semana, foi publicada nos meios de comunicação latino-americanos uma carta assinada pelos cinco líderes, com a defesa explícita da democracia e repúdio às derivações autoritárias. O documento destaca que hoje vivemos um momento crítico, com erosão de instituições, retrocesso de direitos e ascensão de discursos de ódio nas redes — além de alerta para o avanço de redes criminosas que ameaçam a integridade do Estado.
Durante a cúpula, foram definidos eixos principais: a proteção da independência institucional, combate à desinformação e aos extremismos digitais, além da criação de políticas regulatórias para grandes plataformas e inteligência artificial O grupo reafirmou ainda seu compromisso com o multilateralismo e a justiça social.
A estratégia diplomática de Lula
Desde o seu encontro com Boric em abril, Lula já vinha defendendo uma postura estratégica de interlocução com diferentes polos, evitando alinhamentos unilaterais com potências como os EUA ou a China. O acirramento das tensões com a administração Trump reforçou a necessidade deste engajamento diplomático coletivo — a cúpula surge como um contraponto regional às ameaças americanas.
O governo brasileiro, desligado da prática de embates diretos, optou pela via diplomática discreta: a pauta contra Trump foi conduzida de maneira firme, mas sem agressividade explícita — a fim de manter a coesão do bloco latino-europeu presente na cúpula.
Sensibilidade geopolítica
A delegação evitou mencionar nominalmente o presidente Trump, adotando um discurso político mais institucional, embora a mensagem fosse clara: tarifas unilaterais, intervenções políticas e movimentações antidemocráticas não são compatíveis com a cooperação global responsável. Enquanto isso, setores da diplomacia sugerem que o Brasil pode ampliar esforços para criar regulação mais efetiva das big techs, controlar algoritmos e combater discursos extremistas — tudo isso com coordenação regional.
Dinâmica da cúpula
O evento começou com um almoço-organizado, seguido de uma declaração conjunta feita no pátio de La Moneda — um dos momentos mais simbólicos da cúpula e amplamente coberto pela mídia regional. Participou também a sociedade civil ativa, incluindo intelectuais, ativistas e universitários, reunidos no “Festival Democracia”, no campus da Universidade Católica.
Apesar da espinha dorsal unificada, houve divergências em torno de temas como a situação política na Venezuela. Enquanto Boric expressou condenação direta ao regime Maduro, delegações de Lula e Petro adotaram um tom mais moderado — tentando preservar canais de diálogo diplomático mais amplos.
Resultados e projeções
A cúpula celebrou uma plataforma comum em defesa da democracia, institutos democráticos e do multilateralismo, com foco em:
- Combate à desinformação ;
- Regulação de plataformas digitais e big techs;
- Rejeição às pressões tarifárias como instrumentos políticos ;
- Apoio institucional mútuo face a ameaças autoritárias.
Os líderes já alinharam estratégias para levar essas pautas à próxima Assembleia-Geral da ONU, em setembro, fortalecendo sua influência no cenário global.
Considerações finais
O diálogo entre Lula, Boric, Sánchez, Petro e Orsi marca mais do que um encontro diplomático: simboliza a resistência de governos progressistas que veem o avanço de modelos nacionalistas protecionistas e discursos autoritários como ameaças reais às instituições democráticas.
Ao reagir a ameaças externas — como as tarifas de Trump — com unidade e respaldo internacional, o bloco demonstra que a defesa da democracia exige união estratégica, busca por equilíbrio entre potências e vigilância permanente sobre as plataformas digitais, vista já como ameaça à estabilidade social.
Sinais convergentes de fortalecimento regional em prol de valores democráticos e soberanos surgem num momento crucial, em que decisões econômicas e diplomáticas de um só governo — como as dos Estados Unidos — podem repercutir fortemente sobre políticas internas e estabilidade global.
Com a possibilidade de medidas concretas, como propostas regulatórias de big techs, governança digital multilateral e resposta unificada a ameaças comerciais, o grupo pode se consolidar como um ator relevante na arena global. O que resta é observar se haverá continuidade dessa estratégia após a cúpula — e se a “Democracia Sempre” resistirá a incertezas políticas, pressão externa e divisões internas.